segunda-feira, 26 de março de 2012

Air France - On Trade Winds EP (2006) / No Way Down EP (2008)





Pequena curiosidade mórbida: escrevem-se estas linhas no mesmo dia em que a dupla sueca anunciou o seu fim, sem que sejam consequência dessa notícia - mais porque, na última semana de sol, os Air France, como em todas as semanas de sol, foram uma companhia indispensável. Na mesma linha dos Saint Etienne, fizeram da pop mais pura da década que passou, conluio perfeito entre a electrónica mais dançável e o formato canção. On Trade Winds e a fantástica "Karibien" expressaram o lado mais ravey que, a certo ponto, a maioria das bandas de música electrónica pós-Pitchfork se apressavam a apresentar como sinónimo de credibilidade; dois anos depois, No Way Down recusava os braços no ar, preferindo antes a contemplação do azul celeste no seu modo de contar uma história através da melodia. O término das suas actividades é uma perda irreparável, tanto mais que abandonam o circuito sem um tão-esperado longa-duração. Prova de que a perfeição não dura para sempre.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Can - Tago Mago (1971)



Sem Tago Mago seria excepcionalmente difícil caracterizar o psicadelismo alemão dos anos sessenta e setenta, perceber o estado de espírito libertário que estas bandas sentiam no pós-guerra (algo que Julian Cope explica pormenorizadamente em Krautrocksampler). Os Can eram e são, talvez a par dos Neu! via "Hallogallo" e dos primeiros discos dos Kraftwerk, a banda que melhor definiu a sonoridade kraut. Com Damo Suzuki a ponta de lança, homem que já sabia o que era gritar maniacamente antes de Alan Vega o fazer em "Frankie Teardrop", Tago Mago é simultaneamente um disco de rock e uma experiência shamânica, pontuada pelo ritmo tribal de "Halleluwah" ou pelo transe total de "Augmn". Um disco o qual estranhamos e no qual nos entranhamos indefinidamente, tantas são as peças novas que se descobrem a cada audição, como se o tempo não existisse.

segunda-feira, 12 de março de 2012

The Velvet Underground - The Velvet Underground & Nico (1967)



Já tanto se escreveu sobre The Velvet Underground & Nico que se torna missão quase impossível arranjar novos adjectivos que o caracterizem, se bem que, à primeira, décima ou centésima audição, seja daqueles discos onde se descobre sempre algo de novo. Fiquemos, por agora, pelas suas características principais: a voz amargurada e doce da alemã, actriz tornada declamadora da poesia de Lou Reed; as experimentações sónicas de John Cale, manancial de surpresas; o pseudo-amadorismo tribal de Maureen Tucker; a icónica capa, claro, e as canções. Proto-twee em "I'll Be Your Mirror", sujidade rock em "Run Run Run" e "European Son", fantasias étnicas em "Venus In Furs" e a má trip descrita em "Heroin" servem para fazer um par de ouvidos feliz durante longos anos. E fazem com que o disco, merecidamente, ainda seja considerado uma influência, mais de quarenta anos após o seu lançamento.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Galaxie 500 - Today (1988)



Figuras de culto do pós-punk norte-americano dos finais dos anos oitenta e impulsionadores de tudo o que se ouviu nos anos noventa no campo do chamado slowcore, os Galaxie 500 tiveram uma magnífica estreia com Today, porventura o melhor dos seus três LPs, e prova viva de que é possível fazer um grande disco de guitarras sem que seja necessário violar o instrumento. As melodias delicodoces vindas dos dedos de Dean Wareham são a chave principal para se apreciar um álbum que tanto tem de beleza como de melancolia, ora bebendo à tradição folk, ora trilhando caminho pela jangle pop sem abandonar o espírito rock de uma juventude à procura de algo inefável. "Pictures", "Temperature's Rising" ou "King Of Spain" são todas elas candidatas ao título de melhor canção de Today, mas o enfoque terá de ir obrigatoriamente para "Don't Let Our Youth Go To Waste", quase sete minutos de uma maravilhosa e arrebatadora nostalgia, mono no aware em formato de canção pop. Quem teve a oportunidade de ver Wareham a solo na tour que encetou em homenagem às suas antigas canções e banda saberá bem que tudo isto é verdade.